ANDRÉ ROCHAIS, UM PESQUISADOR
(Oferecemos aos leitores extratos de um artigo publicado no Correio especial de PRH-Internacional, em novembro de 1991, intitulado « André Rochais – Fundador de PRH », no qual várias pessoas que tiveram o privilégio de trabalhar e conviver com ele escreveram sobre um traço central de sua personalidade, a partir do qual PRH emergiu e ocupa o seu lugar a serviço da humanidade.
Desejamos que a leitura desta matéria possa ajudar o leitor a perceber melhor este aspecto de pesquisador, um dos traços centrais de André Rochais, cujo fruto é o instrumento de formação PRH que utilizamos e oferecemos).
André Rochais tornou-se educador, psicopedagogo e pesquisador porque desejava ajudar cada pessoa a ser si mesma. Ele dizia: « nossas inconsciências, nossa falta de conhecimento, nossa má vontade sempre introduzem a desordem… A força da ordem original é tanta que pode curar a desordem e restabelecer a harmonia, com a condição indispensável de que a inteligência e a vontade humana queiram de verdade e humildemente colocar-se na busca desta ordem original e cooperar para a própria reconstrução… ».
A serviço da transformação do homem
O interesse pelas pessoas se manifesta desde o começo de sua pesquisa e mobiliza André por inteiro. Recordo-me da quantidade de trabalho que ele era capaz de oferecer. Não tinha um minuto para si. Quando saía da sala durante uma sessão 2 que dava, recebia as pessoas.
No fim da tarde continuava trabalhando até o início da noite… Sempre estava presente nele o cuidado em ajudar aos outros. Havia nele um contraste: André era profundamente altruísta e, ao mesmo tempo, não se podia dizer que fosse o que se chama de « um homem da sociedade ». Ele sempre conservou o aspecto de um homem reservado, um pouco solitário.
Entretanto, nunca vi André vivendo movimentos de egocentrismo e egoísmo. Nele, sempre estava presente este reflexo: « O que eu posso fazer para ajudar ao outro? »
Andréa Lumeau
O pedagogo
Ao longo da minha primeira sessão de formação, em setembro de 1968, fiz contato com o pedagogo André Rochais. Uma das chaves de compreensão de sua pesquisa e de seu dom de pedagogo é ajudar a pessoa autoconhecer-se.
Qualquer que fosse o setor do seu trabalho, de sua atividade, em todo o seu modo de ser e de fazer transpirava o pedagogo. Como ele mesmo dizia, «sou mais educador que professor». Sua intenção não era nos fazer acumular conhecimentos sobre o ser humano, mas nos permitir fazer a experiência do ser humano que somos.
O pedagogo formador
A atuação em suas sessões de formação continha muito deste cuidado, visando nos permitir entrar nesta experiência. Permanece muito viva em mim sua arte para transmitir tudo o que descobria sobre o ser humano. Entre outras coisas, isto se traduzia em anedotas, numa espécie de «parábolas», que ele contava com grande simplicidade. Parece que ainda o vejo pegando um botão de rosa, depois uma navalha, e tentando lentamente abrir o botão de rosa à força… Certamente, a reação do público era imediata. Para ele era fácil fazer compreender, a partir do interior, a importância do respeito aos ritmos, às leis de crescimento e ao desenvolvimento do ser humano. Ele dizia com muita frequência: « não adianta puxar a vida para que ela cresça mais depressa ».
O pedagogo na relação de ajuda
Quantas pessoas experimentaram sua incansável paciência, uma paciência que sabia esperar, que sabia recomeçar e que nunca desistia. Preocupado com a eficácia no trabalho, nunca se cansava de pesquisar os pontos que revelassem vida na pessoa. Por experiência própria, sabia que era essencial encontrar pontos de apoio vitais para se arriscar a comprometer-se em um autêntico processo de ordenação.
Seu cuidado com a eficácia se manifestava também na proposta de «receitas» que ele dava às pessoas ao final da entrevista, receitas estas que foram se transformando em mini-instrumentos pedagógicos. A observação de uma dificuldade, de um funcionamento desajustado, colocava-o rapidamente na busca de algo a ser trabalhado ou a ser tocado, esclarecido,
para que a pessoa pudesse enxergar sua própria verdade, aceitá-la e, então, entrar no caminho de ordenação. Dizer a verdade com respeito, com afeto, era uma das constantes em sua relação com os outros.
O pedagogo na criação do instrumento
Toda sua criação era confrontada com a experiência das pessoas, antes de ser elaborada em um documento definitivo. Quando estava presente em uma sessão de formação « experimental » nós éramos testemunhas da verdade do que ele dizia com frequência: « meu mestre de pensamento é a realidade ». Éramos testemunhas também da sua capacidade de escutar as pessoas. Toda a experiência de cada um lhe interessava, nenhum detalhe era insignificante para ele. No momento em que compartilhávamos nossas descobertas, levava em consideração as menores observações. Ele tinha a arte de fazer a «perguntinha» que permitia à pessoa expressar-se mais e com maior precisão… Caso a formulação dos TPA (Trabalhos pessoais de análise) não tivesse sido eficaz, André não tinha nenhuma dificuldade em deixá-lo de lado e buscar outra coisa. Ele não vivia nenhuma apropriação daquilo que criava… Sentia-se constantemente atento a tudo o que podia melhorar o instrumento e torná-lo mais eficaz.
Marie-Anne de Le Guyader
André Rochais, um pedagogo durante uma sessão de formação.
Eu tive a oportunidade de trabalhar frequentemente em sessões de formação com André Rochais. Nos últimos anos de sua vida, já não tinha muita força para a condução uma sessão e trabalhar ao mesmo tempo na melhoria do instrumento que criava. Assim, pedia a outro formador para dar a sessão na qual se fazia presente para melhorá-la. Como eu dei muitas sessões de formação em La Puye, tive a sorte de vê-lo trabalhando em cinco ou seis sessões que ele acabava de criar ou de modificar. O que permanece mais presente em mim é a sua atitude frente a cada um dos participantes das sessões de formação: tudo o que se dizia era levado em conta, nada era deixado de lado. Tudo era, sem cessar, tomado como um canteiro que lhe parecia poder ser útil para alguém, ajudar, permitir avançar mais rapidamente, facilitar a tarefa. Diante de alguém que não compreendia algo, nunca lhe ouvi dizer « você não entendeu », mas sim « o que eu poderia fazer para ajudá-lo? ». Esta paixão pelo caminho do outro lhe realizava permanentemente em sua criatividade de pedagogo. Quantas vezes eu o vi chegar pela manhã com um novo TPA, com uma contribuição modificada, um mini-instrumento melhorado, que havia « colhido » durante a noite… Sua paixão o despertava! Quantas vezes eu o vi como que parado quando alguém expressava algo novo a ele. Então, inclinava ligeiramente a cabeça como que para apoiar-se em si mesmo, aguçava o ouvido com o seu corpo imobilizado, como que se preparando para um assalto, e dizia: « repete-me isso, repete-me isso ».
Assim, vi André tomar consciência de um « funcionamento » que não havia percebido antes, e acrescentá-lo na continuação da sessão « Conduzir a minha vida ». (atualmente intitulada « Viver com mais harmonia »). Também o vi inventar um mini-instrumento na sessão «Introdução à análise PRH» (atualmente « Explorar o meu mundo interior ») a pedido de
um participante que não chegava a captar o que era uma sensação. Pude vê-lo modificar, diretamente, durante uma sessão « Minha vida em grupo » (atualmente « Viver melhor nos meus grupos ») , o mini-instrumento « Eu faço os meus TPA com método » para ajudar uma pessoa com tendência cerebral a entrar em sua sensação.
A seguir, autor deste último exemplo dá testemunho disso.
Claude Rouyer
Relato de um testemunho
Tive a sorte de participar em duas sessões de formação PRH em La Puye, nas quais André Rochais estava presente. Entre outras coisas, recordo-me de duas atitudes dele. Uma a respeito da melhoria da pedagogia dos TPA (Trabalhos pessoais de análise): depois do enunciado de um novo TPA pelo formador, André me olhava atentamente e constatava minha perturbação, minhas visíveis dificuldades em meu rosto, parecia que me perguntava com os olhos. Eu disse a ele que a continuação do TPA precedente exigia um «grande passo». Os outros participantes confirmavam minha afirmação e André me perguntou que « passo » intermediário eu gostaria de dar. Então eu formulei meu próprio questionamento que, depois de ter sido revisado por ele, passou a ser um novo TPA. Eu admirei a « docilidade de mestre » para ajustar-se às necessidades dos «clientes» e à realidade da experiência. Sua inteligência e sua humildade me maravilharam. A outra atitude diz respeito a uma observação pessoal que ele me fez diante de todos ao ver minhas dificuldades para « captar minhas sensações ». Tendo percebido rapidamente o meu funcionamento ele me disse: « Me dá pena, porque você trabalha como um intelectual, utilizando somente a cabeça. Por que você não utiliza todo o seu corpo? ». Como eu não entendia sua observação, ele me deu o seguinte conselho: « Depois de copiar seu TPA (na época, os TPA eram copiados do quadro-negro) 7 não escreva nada logo em seguida. Deixe
o seu lápis, feche os olhos e procure localizar em você mesmo, em seu próprio corpo a sensação produzida pelo TPA. Não pegue o lápis enquanto não estiver invadido pela sensação, enquanto não puder mais se conter para escrever ».
Olivier (um sessionista)
Uma obra gigantesca
No campo das ciências humanas, é raro encontrar uma obra de um pesquisador que dê provas de uma investigação tão ampla e tão impressionante.
Uma obra é gigantesca quando cada descoberta ou cada ponto importante dela é convertido imediatamente em um instrumento pedagógico para facilitar o acesso a ela através da autodescoberta.
Esta amplidão é acompanhada também de profundidade na pesquisa. André Rochais levou muito longe a análise da realidade humana, entrando em diferentes zonas da vida psíquica, não perceptíveis e, portanto, não decifráveis em uma primeira abordagem (sobretudo no que se refere ao ser). Ao longo dos meus estudos, jamais encontrei uma antropologia que
colocasse em evidência, com tanta perspicácia, as características de um homem saudável, permitindo por este simples fato uma localização mais afinada do que é desarmonioso nele.
Michel Lamarche
Um pesquisador que avançou na verdade sobre o homem
Quando encontrei André Rochais, o que mais me impressionou foi o pesquisador desta verdade sobre o homem. Não a partir dos livros ou das ideias, mas escutando e recolhendo experiências das pessoas. Isto não era comum nessa época. Chamou-me atenção, sobretudo duas coisas: a primeira foi a sua maneira de escutar. Aí ele já procurava esboçar os TPA, isto é, fazia espontaneamente perguntas. Ele tinha um modo de escutar que não era simplesmente uma acolhida do que o outro dizia, não era simplesmente uma compreensão. Por trás de sua escuta percebia-se um pesquisador que perseguia suas próprias intuições e que desejava ir além, que desejava verificar… Isto era tão visível que as pessoas se deixavam levar por este movimento e se sentiam participando de sua pesquisa.
Creio que o grande êxito de todas as suas primeiras sessões de formação vinha daí. As pessoas faziam parte de suas pesquisas. Quando alguém dizia algo, ele levava isto em conta com seriedade.
A segunda coisa que me chamou atenção foi a forma como ele recebia as perguntas e as interpelações. Quando alguém dizia: « Eu não estou de acordo com… » em vez de se defender ou de defender seu ponto de vista respondia: « Bom, siga em frente, vamos ver, diga-me o que você vive ». A pessoa que fazia a pergunta imediatamente se sentia desarmada e se colocava em busca para precisar e aprofundar sua opinião.
Certamente, André tinha qualidades de pesquisador e dons pedagógicos excepcionais. Mas o que me parece primordial era o seu amor pelo homem. Era isto que motivava sua pesquisa, e não o inverso. Creio que André jamais teria sido um pesquisador caso não tivesse como tela de fundo a motivação de fazer o homem avançar em humanização e viver melhor.
Um pesquisador que se admirava pelo que descobria
Quando descobria algo novo para PRH, André se maravilhava com a descoberta, como se não fosse ele que a tivesse feito. Ele me dizia: « Vou ler o que encontrei ». Ao final, acrescentava: « Isto não está mal, está bom, não parece? ». Vivia aí um puro prazer, um prazer ao centrar-se em si. Maravilhava-se muito com estas coisas, acolhendo-as como algo que lhe era dado, vendo que isto lhe surgia de repente, o que o fazia avançar. Não buscava receber cumprimentos. Simplesmente admirava-se por aquilo que criava. Vivia a mesma coisa quando me dava seus manuscritos e as Notas de Observações para ler. No início, eu prestava atenção, sobretudo ao que eu sentia que poderia ser dito de outro modo, e ao que teria que retificar ou precisar. De vez em quando, eu colocava uma reação, como por exemplo: «muito bem» ou « OK », quando sentia formidável aquilo que ele tinha escrito.
Porém, eu não fazia isto com frequência. Certo dia eu estava diante dele, lia suas folhas e, de repente, ele me disse: « Você não coloca muitas reações! » Então, me dei conta de que isto era importante para ele e lhe disse: « Isto é tão importante para você? » Ele me respondeu: « Claro que é importante! ». Desde então eu passei a prestar mais atenção, no sentido de reagir mais nos dois sentidos, tanto no que se refere ao que sentia claro e ajustado como no que não me parecia assim.
Nele, este sentimento de admiração em relação ao que surgia era acompanhado de uma expressão: « isto será bom para ajudar as pessoas, deve fazê-las avançar, ganhar tempo em seu caminho… ».
ANDRÉ ROCHAIS: UM « VULGARIZADOR »
Sem dúvida, sua pertença a um ambiente popular produziu nele o cuidado constante no sentido de colocar as riquezas das Ciências Humanas ao alcance de todas as pessoas. Ele dizia: « Sou profundamente vulgarizador. Sempre tive este cuidado de fazer chegar até o homem comum todas as riquezas que há no mundo da psicologia. Não é justo que as pessoas comuns não tenham o direito de receber numa linguagem compreensível tudo o
que lhes poderia permitir existir segundo o que são… »
« Sempre procurei encontrar meios que permitam o crescimento das pessoas… Estive sempre preocupado em inventar algo novo. Encontro aqui, um aspecto que eu chamaria de pesquisador, quer dizer, alguém que está à espreita do que pode dar um melhor resultado na educação… »
Um contínuo ajuste à realidade
Um dos traços mais destacados da personalidade de André Rochais foi sua simplicidade, que era constituída pelo seu realismo e seu contínuo ajuste à realidade. Sua inteligência se caracterizava por uma clareza simples. Ele tinha o dom de fazer as coisas compreensíveis e simples. Sempre viveu seu aspecto de « vulgarizador » com qualidade, pois como ele mesmo dizia: «Isto permite fazer com que as pessoas simples compreendam as
descobertas das Ciências Humanas».
Andrée Lumeau
Um dom de inteligência do homem e seu crescimento
O dom de pedagogia em André era acompanhado de um dom de compreensão do homem e do seu crescimento. Um dom para decifrar a realidade humana, para captar sua complexidade e os seus dinamismos. O pedagogo André estava a serviço da transmissão da inteligência do ser humano e do seu crescimento. Dizia ele: « Não é justo que o conhecimento sobre o homem, sobre as suas leis de crescimento esteja reservado a poucos… Não… Não!…Não! »
Poderíamos dizer que este cuidado em transmitir a todo ser humano as riquezas descobertas no mundo da psicologia foi um potente motor para a sua pesquisa. Por isso, a elaboração do sistema explicativo foi dinamizada. A criação do instrumento pedagógico foi estimulada, num processo de aperfeiçoamento e, portanto, de eficácia.
Frequentemente André Rochais expressava o seu desejo de nos deixar um instrumento o mais perfeito possível, não por viver um desejo de perfeição por si só, mas porque sabia, por experiência, que a eficácia da formação PRH estava ligada à perfeição do instrumento.
Marie-Anne Le Guyader
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